Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA)

ANO 23 • • Nº 43

ÓRGÃO OFICIAL DA SOCIEDADE PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE

Porto Alegre | RS

Autora

Cátia Deon DallAgno

Editora do Jornal

Conselho Editorial

Kátia Ramil Magalhães

Diretora de Publicações

Laura Meyer da Silva

Comissão Editorial

Leonita Beatriz Tramontina Serena

Comissão Editorial

Carla Brunstein

Comissão Editorial

Ana Paula Mezacaza Filippon

Comissão Editorial

Tragédias contemporâneas: da crueldade às possibilidades de reparação

  • Em meio à crueldade da devastação a vida resiste, na esperança de reparação.

Ao longo de sua obra, Freud aponta em muitos momentos que a crueldade, em sua confluência com a pulsão de morte, é uma característica intrinsecamente humana. Por outro lado, a cultura, cujas raízes encontram-se na pulsão de vida, oferece possibilidades também humanas de reparação das vicissitudes da crueldade. Na contemporaneidade, a crueldade tem se manifestado de diversas formas, desde aquelas ligadas à violência sutil, cotidiana, até os tipos mais evidentes, como o abuso sexual, a violência doméstica, a crueldade contra as crianças e idosos, o bullying, o preconceito em relação às minorias. É possível ainda falar da crueldade que se manifesta nas redes sociais e na polarização nas discussões políticas, em que parece não existir espaço para a divergência. Presenciamos também a violência extrema, que se expressa nos crimes hediondos, nas sangrentas guerras e nos ataques ao meio ambiente, fonte de toda a vida na Terra.

Vivemos, desde tempos inomináveis, em convívio com esta condição paradoxal que é inerente ao ser humano: a presença da crueldade, que ataca a capacidade de pensamento e palavra, acabando por se derramar no externo, versus a necessidade de promover reparação e cuidado para a continuidade da vida. No entanto, na atualidade, parece-nos que tais movimentos acabam presentificados de maneira traumática através da rapidez com que as notícias chegam até nós. O ser humano bombardeia a própria humanidade com informações de conteúdos primitivos, muitas vezes sanguinários, que esgarçam o tecido mental, promovendo mais dificuldade de pensar e restaurar aquilo que tão cruelmente se manifesta.

Pensando a respeito do exposto acima, a equipe editorial do jornal da SPPA resolveu mergulhar nas questões referentes à crueldade e suas manifestações, mas contemplando, também, a capacidade humana de reparar aquilo que ficou na iminência de ser destruído por seus impulsos agressivos. Convidamos, então, três psicanalistas de nossa Sociedade para escreverem a respeito do tema, estimulados por perguntas de nossa redação. O resultado deste trabalho encontra-se em nossa reportagem de capa.

Enquanto trabalhávamos no assunto, uma catástrofe climática sem precedentes abateu-se sobre o nosso estado, encharcando provisoriamente a capacidade de pensamento e palavra de todos nós. No entanto, conseguimos seguir com movimentos reparatórios internos, os quais foram permitindo a gradual restauração destas capacidades, como o leitor poderá constatar quando ler o jornal.

Nesta edição, contamos com os artigos autorais de Ruggero Levy, Regina Sordi e Suzana Depermann Fortes, colegas psicanalistas que escreveram textos com as marcas de tamanha tragédia, sem, no entanto, se desviarem de nosso tema central. Nossas diretorias estão também contempladas, trazendo informações úteis sobre a SPPA a todos que se interessam por psicanálise.

Boa leitura a todos!